O aumento da alíquota da contribuição previdenciária dos servidores públicos por lei estadual é compatível com a Constituição. Demonstrado déficit financeiro ou atuarial da previdência, a majoração dessa cobrança não afronta os princípios da razoabilidade e da vedação ao confisco.
Esse entendimento está prestes a ser formado pelo Supremo Tribunal Federal, que até a manhã deste domingo (17/10) tinha maioria de sete votos formada no Plenário virtual da corte. O julgamento tem previsão para acabar à meia-noite de segunda-feira (18/10).
Confirmado o resultado, a corte terá dado provimento ao recurso extraordinário ajuizado pelo governo do Goiás contra a decisão do Órgão Especial do Tribunal de Justiça do estado, que declarou inconstitucional a lei que aumentou o índice de contribuição previdenciária dos servidores, de 11% para 13,25%.
A norma contestada é a Lei Complementar Estadual 100/2012, que não está mais em vigor, pois foi revogada pela Lei Complementar estadual 161/2020.
Ainda assim, o STF entendeu pertinente a análise do tema devido ao cenário de crise previdenciária enfrentada no Brasil. Assim como Goiás fez, outros estados têm discutido aumento da alíquota incidente sobre a contribuição previdenciária de seus servidores, as quais devem gerar ações contestando a constitucionalidade do dispositivo.
Essa majoração decorre, inclusive, da Emenda Constitucional 103/2019 — a reforma da Previdência —, que proibiu Estados, Distrito Federal e Municípios com déficit atuarial de adotar alíquota de contribuição previdenciária inferior à dos servidores da União, fixada em 14%.
Esse valor pode ser reduzido ou majorado de acordo com o valor da base de contribuição ou do benefício recebido.
“Ou seja: é de extrema relevância saber se o aumento da alíquota de 11%, que vinha sendo praticada ao redor do país e deverá ser majorada por força da EC 103/2019, é compatível com a Constituição”, justificou o relator, ministro Luís Roberto Barroso, ao afastar a perda de objeto do recurso extraordinário.
Em Goiás, a ação foi ajuizada pela Associação dos Magistrados do Estado de Goiás (Asmego). Ao analisar o caso, o TJ-GO entendeu que a majoração feita por lei é inconstitucional porque foi promovida sem o devido cálculo atuarial que comprovasse a necessidade da majoração.
Para o STF, no entanto, a conclusão é de total compatibilidade, mesmo nas hipóteses em que a lei for aprovada sem a inclusão desse estudo atuarial específico e prévio. Isso porque o que a Constituição exige no artigo 149, parágrafo 1º é a existência da necessidade de fazer frente ao custeio das despesas do regime previdenciário.
E, no caso de Goiás, isso foi demonstrado por meio de avaliação segundo a qual o Regime Próprio da Previdência Social (RPPS) tenderia a apresentar déficits financeiros anuais a partir de 2013, com crescimento até 2036.
Se o RPPS sofre déficit, o estado é obrigado a recorrer ao Tesouro para arcar com o pagamento de aposentadorias e pensões, o que diminui investimento em outras áreas da administração pública.
Por isso, o ministro Barroso destacou que não existe problema em o chefe do Poder Executivo justificar o acréscimo na alíquota da contribuição previdenciária com base na necessidade de liberar essas verbas para serem destinadas a obras e serviços essenciais à população.
“Note-se que não se trata de carrear o valor arrecadado com contribuições previdenciárias para outras finalidades, o que seria vedado, mas de reduzir o déficit no regime próprio e, desse modo, diminuir o volume de aportes de recursos desvinculados do tesouro para a Previdência Social”, afirmou o relator.
Pelo mesmo motivo, afastou a ocorrência de confisco por parte do estado. Para o TJ-GO, a lei impugnada buscou reduzir o déficit previdenciário para a formação de recursos outros que não a proteção à seguridade social, o que não é exatamente o caso.
Ao acompanhar o relator, o ministro Alexandre de Moraes citou precedente do STF no sentido de que “se o estado-requerente não puder reduzir o déficit do RPPS com a solidariedade dos servidores públicos, esses valores serão cobrados de toda a sociedade”.
Barroso propôs duas teses, até então acompanhadas pelos ministros Cármen Lúcia, Gilmar Mendes, Alexandre de Moraes, Dias Toffoli, Luiz Edson Fachin e Rosa Weber. Até a manhã deste domingo, nenhum outro julgador havia divergido.
Teses aprovadas:
1. A ausência de estudo atuarial específico e prévio à edição de lei que aumente a contribuição previdenciária dos servidores públicos não implica vício de inconstitucionalidade, mas mera irregularidade que pode ser sanada pela demonstração do déficit financeiro ou atuarial que justificava a medida.
2. A majoração da alíquota da contribuição previdenciária do servidor público para 13,25% não afronta os princípios da razoabilidade e da vedação ao confisco.
Fonte: Wagner Advogados Associados