Os três poderes estão procurando vias alternativas para solucionar a questão do “meteoro”, forma como o ministro da Economia, Paulo Guedes, vem se referindo aos R$ 89 bilhões em precatórios devidos pelo governo.
O presidente do Supremo Tribunal Federal, Luiz Fux, propôs uma forma para que não houvesse calote, mas sem extrapolar o orçamento da União.
A ideia é pagar a dívida de acordo com a lei do teto de gastos, separando os precatórios que seriam pagos em 2022 dos que serão pagos em 2023, o que o ministro chamou de “microparcelamento”.
Segundo o Valor Econômico, Guedes manifestou simpatia pela ideia do ministro, afirmando que inicialmente considerava o caminho da Proposta de Emenda Constitucional, que vem sendo duramente criticada, mas agora considera que a nova proposta pode funcionar.
O presidente do Senado, Rodrigo Pacheco (DEM-MG) também aceitou a fórmula de Fux. Disse que a PEC enfrenta resistência do Congresso, porém, como na ideia apresentada haveria mediação do Conselho Nacional de Justiça, ele acredita que os parlamentares podem ser favoráveis. O presidente da Câmara, Arthur Lira (PP-AL), também demonstrou interesse.
O presidente do STF ressaltou que, apesar do alto valor devido pelo governo, o poder público também arrecada muito com decisões judiciais. Fux explicou que, para a concretização de sua proposta, precisa haver alinhamento entre o Legislativo e o CNJ.
O CNJ seria responsável por negociar e definir uma regra para compatibilizar a despesa com o teto de gastos. Levando em consideração a atualização do volume pago em 2016, ano em que começou a regra do teto, seria definido o valor a ser pago ainda em 2022. O restante seria pago em 2023, com prioridade sobre novos precatórios expedidos.
Propostas da OAB
A Ordem dos Advogados do Brasil também apresentou propostas para que seja possível pagar os precatórios sem afetar demasiadamente o orçamento da União. O presidente da Comissão Especial de Precatórios da OAB, Eduardo Gouvêa, disse ao Valor que a OAB identificou sete soluções alternativas para o problema, evitando a PEC, que considera repleta de dispositivos inconstitucionais.
A primeira solução seria possibilitar ao devedor comprar os precatórios desvalorizados e usá-los para quitar seus débitos inscritos na dívida ativa da União.
Para o maior problema, R$ 15,6 bilhões de precatórios devidos a quatro estados, Gouvêa propôs a emissão de títulos da dívida pública para a despesa ficar de fora do teto de gastos.
Outra sugestão da OAB é permitir que precatórios possam ser convertidos em títulos, através da criação do Certificado de Recebíveis Judiciais, a exemplo dos Certificados de Recebíveis do Agronegócio (CRAs) e os Certificados de Recebíveis Imobiliários (CRIs).
A quarta proposta seria trocar precatório por imóveis, possibilidade que já existe na legislação. Para Gouvêa também seria possível que a União estabelecesse parâmetros para conciliação com os credores.
Seria possível, ainda, criar um fundo, fiscalizado pelo CNJ, para utilizar parte dos R$ 500 bilhões em depósitos judiciais para financiar o pagamento de precatórios. Por fim, os créditos decorrentes dos precatórios poderiam ser direcionados aos fundos de infraestrutura, via Parcerias Público-Privadas (PPPs) ou concessões. Dessa forma, poderiam ser utilizados como garantia em empréstimos para investimentos, exemplificou o Gouvêa.
A PEC e os precatórios alimentares
No último dia 9, o Congresso Nacional recebeu a Proposta de Emenda Constitucional 23/2021. Por meio dela o governo pretende estabelecer o parcelamento obrigatório de todos os precatórios com valor superior a R$ 66 milhões, a serem pagos 15% à vista (até o final do exercício financeiro seguinte ao da constituição do precatório) e o restante em nove parcelas anuais.
A PEC impõe uma limitação provisória dos pagamentos anuais de precatórios a 2,6% da receita corrente líquida (RCL), o que também sujeita precatórios entre R$ 66 mil e R$ 66 milhões a eventual parcelamento.
Porém, a Associação Nacional dos Auditores Fiscais (Unafisco), com base em dados do Conselho da Justiça Federal, pontuou que em 2020 foi atingido o percentual de 4,87% da RCL e em 2021 o percentual foi 3,94%.
Dessa forma, a Unafisco afirma que é possível que até precatórios alimentares — aqueles que se referem a salários, vencimentos, pensões, benefícios previdenciários, entre outros — sejam objeto de parcelamento.
Em nota, a Unafisco ressalta que a existência dos precatórios alimentares se dá pela violação do Estado, enquanto empregador, de direitos dos servidores públicos — seus empregados. A recomposição destes direitos ocorre na forma dos precatórios alimentares.
Para a associação, há outro item que dificultará o pagamento das dívidas judiciais da União. A PEC prevê que todas as ações coletivas dos servidores sejam concentradas no Tribunal de Justiça do Distrito Federal, o que provocará um gargalo gigantesco, alongando ainda mais a morosidade das decisões judiciais. Se hoje essas demandas chegam a quase 30 anos, o litígio poderá se arrastar facilmente por 40 anos se concentradas em um único tribunal.
Fonte: Wagner Advogados Associados